terça-feira, 12 de julho de 2011

Pesquisa mostra lado negro do otimismo

Ser otimista pode ser desastroso: a pessoa cria falsas expectativas, subestima riscos e se dá mal.Mas não pensamos nisso. De acordo com as últimas descobertas da neurociência, somos mais otimistas do que realistas, o que não deixa de ser uma irracionalidade do cérebro.

O lado "dark" do pensamento positivo é objeto de estudo da neurocientista israelense Tali Sharot, que acaba de lançar o livro "The Optimism Bias -A tour of the irrationally positive brain" (o viés otimista, um tour pelo cérebro irracionalmente positivo), sem edição no Brasil.

Certo tipo de atitude esperançosa, tão incentivada pela cultura atual, "pode levar a enormes erros de cálculo e fazer com que as pessoas não façam exames de saúde, não apliquem protetor solar ou não abram uma poupança", disse à Folha Sharot, que é pesquisadora da University College London.

Ela estudou como o viés positivo se forma no cérebro. Para isso, registrou as atividades de voluntários enquanto eles imaginavam eventos futuros e passados.

Descobriu que a maioria das pessoas, cerca de 80%, acha que o futuro será melhor. E muitas delas imaginam cenas hollywoodianas.

"Achamos que não vamos ter câncer, nos divorciar ou perder o emprego. E pensamos que vamos viver até 20 anos a mais do que a expectativa de vida."

É como se as estatísticas não funcionassem em primeira pessoa. A explicação para o viés positivo é evolucionista: sem o otimismo, ninguém atravessaria a rua.

"É uma forma que a espécie encontrou para seguir em frente, enfrentar o presente e fazer a vida correr", diz Roberto Lent, neurocientista e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Para a neurologia, o otimismo é a formação de imagens mentais no cérebro, nas mesmas regiões em que ficam as lembranças. "A projeção do futuro é, muitas vezes, feita em comparação com o passado", complementa Lent.

Já para a filosofia, o pensamento positivo pode ser visto como uma premissa, segundo Jorge Claudio Ribeiro, professor da disciplina na PUC de São Paulo.

"A fé é a atitude básica da vida humana. Se não temos fé, não comemos fora de casa e não bebemos água, porque pode estar contaminada. O otimismo vem antes da desconfiança."

Segundo a terapeuta Dulce Critelli, o futuro pauta as ações do presente. "O homem não vive em função do que já foi ou já fez, mas do que pode ser. Marcamos nossas agendas para amanhã. Atravessamos a rua buscando algo que não temos."

O problema (ou o risco) é que só é possível projetar o futuro por meio da fantasia. E daí a perder a mão e ser fantasioso demais é um pulo.

LENTE COR-DE-ROSA

Ser muito otimista é como fugir da realidade, explica a psicanalista Giselle Groeninga, da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.

"Pode ser um mecanismo de defesa para evitar o sofrimento. A pessoa passa a viver num mundo de fantasia e, muitas vezes, para continuar nesse nível, falseia mais e mais a realidade."

Trata-se de um otimismo não realista, vendido por muitos best-sellers que prometem pílulas de ânimo.
Para Critelli, é como se esses livros se aproveitassem do possível viés otimista descrito pelos neurologistas: quem acredita, compra.

Lidia Weber, psicóloga e professora da Universidade Federal do Paraná, diz que, apesar de ser uma forma de placebo (e placebo pode funcionar), o otimismo de autoajuda é alienante.

"Achar que podemos tudo é muito ingênuo. Podemos acreditar tanto que não faremos nada de fato."

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